quarta-feira, 16 de julho de 2014

Interrogar Deus na poesia portuguesa contemporânea



A Fundação Cupertino de Miranda (FCM) e a Câmara Municipal de V. N. de Famalicão organizaram, em parceria, o evento "CARMINA 1 – Deus como interrogação na poesia portuguesa", nos dias 11 e 12 de julho, sexta e sábado. Consistiu no Encontro de Poesia, reunindo críticos literários e autores, culminando no lançamento de uma antologia, intitulada Verbo (Deus como interrogação na poesia portuguesa), obra editada pela Assírio & Alvim, e organizada por José Tolentino de Mendonça e Pedro Mexia.

A antologia contém poemas de Vitorino Nemésio, Ruy Cinatti, Jorge de Sena, Sophia de Mello Breyner Andresen, Fernando Echevarría, José Bento, Ruy Belo, Cristovam Pavia, Pedro Tamen, Armando Silva Carvalho, Carlos Poças Falcão, Adília Lopes e Daniel Faria. 

Em concorridas sessões, o público teve a oportunidade de ouvir nomes como Sousa Dias, Alex Villas Boas, Fernando J. B. Martinho, Maria João Reynaud, Rosa Maria Martelo, Maria João Costa, Frederico Lourenço, Jorge Sousa Braga, Rui Lage e Pedro Sobrado; além dos poetas Armando Silva Carvalho, Carlos Poças Falcão, Fernando Echevarría. Fica um breve texto em forma de desafio à reflexão:

“Deus como interrogação, assim se chama a antologia, porque Deus existe, na poesia como na vida, em modo interrogativo, mesmo para quem tem fé. Esta não é uma antologia para crentes ou para não-crentes, é uma antologia de poesia que dá exemplos de um tema, de um motivo, de uma obsessão, exemplos portugueses, numa época que também nos deu Claudel, Eliot, Luzi ou Milosz, poetas com uma questão, com uma pergunta que nunca está respondida.”

segunda-feira, 14 de julho de 2014

Professora Cristina Beckert: In Memoriam

Foi com enorme surpresa que tomei conhecimento do falecimento da Professora Cristina Beckert; eu não queria acreditar! Sabia que estava doente e com limitações em termos de mobilidade, mas não imaginava que a sua vida chegaria ao fim tão cedo.
Conheci-a na década de oitenta, num colóquio na Católica, em Lisboa. Foi-me apresentada pelo Professor Cerqueira Gonçalves, que me pediu para receber na Faculdade, em Braga, quatro assistentes do Departamento de Filosofia da Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, grupo de que faziam parte Cristina Beckert e o marido, Carlos João Correia. Vinham fazer investigação para as respectivas teses de doutoramento. Acompanhei-os durante essa sua estadia; foi o primeiro contacto. Em 1993 tive o privilégio de ser seu arguente nas provas públicas de doutoramento, no dia 14 de Julho. Apresentou um texto excelente, depois publicado em livro, Subjectividade e diacronia no pensamento de Levinas[1]. Como era de esperar, fez umas provas brilhantes, com domínio perfeito da matéria e com uma cultura filosófica digna de nota. Apresentou-se tal como era: calma, serena, suave, simples, com um sorriso nos lábios e respondendo com elegância e acerto. Foi a minha estreia em júris de doutoramento e não podia ter sido mais auspiciosa.
Mantivemos o contacto e a convivência deu origem a uma amizade que não esquecerei. Fui bastantes vezes arguir a teses de mestrado à Faculdade de Letra de Lisboa a cujos júris pertenci por sua sugestão, e ela veio várias vezes à minha Faculdade também para arguir a teses. Recebia-me sempre com amizade e delicadeza irrepreensíveis, informando-me e prevenindo-me dos hábitos da casa. Participei a seu convite num colóquio que organizou sobre Lévinas, cujas conferências reuniu no livro Lévinas entre nós[2]; por sua vez a meu convite participou no colóquio de homenagem ao Professor Roque Cabral com um texto intitulado «Ética e ecologia»[3].
A última vez que a contactei foi no fim do ano passado. Havia que constituir um júri de umas provas de doutoramento cuja tese, que eu tinha orientado, era fundamentalmente em torno da obra de Lévinas. Durante o tempo que acompanhei a elaboração do trabalho sempre pensei sugerir ao Conselho Científico o nome da Professora Cristina Beckert para arguente. A tese era excelente e uma arguição da professora, estava eu convencido, permitiria ao doutorando brilhar e obter sugestões preciosas para uma última revisão do texto antes da publicação. Quando propus o nome, avisei logo os responsáveis de que da última vez que tinha contactado com a Professora, ela me tinha falado da sua saúde, que lhe impunha algumas limitações em termos de viagens. A pedido do Presidente do Conselho Científico telefonei-lhe para a sondar. Como sempre, atendeu-me com toda a simpatia, agradeceu o convite, mas informou-me de que infelizmente o seu estado de saúde não lhe permitia aceitar; por indicação médica não podia viajar para fora de Lisboa. Respondi-lhe que tinha imensa pena por ela e pelo doutorando. Por ela, porque as limitações que a doença lhe impunha deveriam ser muito dolorosas; pelo doutorando, porque seria muito beneficiado com a arguição dela. Mas não suspeitava de que o fim estivesse tão próximo.
Curiosa coincidência: recebi a notícia da morte quando tinha começado a ler o seu livro titulado Ética[4]. Nele encontramos a autora de corpo inteiro. O livro revela uma professora informada, cujo texto espelha, com clareza e rigor, uma vasta bibliografia lida e assimilada, acompanhada de uma reflexão pessoal inteligente e profunda. O esquema mostra uma especialista em Ética atenta à actualidade, para quem as éticas aplicadas não são éticas menores, antes pelo contrário. A segunda parte do livro é sobre Bioética e Ética Ambiental, áreas que frequentou com grande competência.
Com o seu desaparecimento perde o Departamento de Filosofia da Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa uma professora e investigadora de eleição, competente e eficaz no seu ensino, de quem havia ainda muito a esperar (leiam-se os depoimentos de vários alunos em http://blog.domingosfaria.net/2014/06/memoria-cristina-beckert-1956-2014.html). Os colegas e amigos perdem uma companheira de jornada com que podiam contar e que permanecerá nas suas memórias.

José Henrique Silveira de Brito




[1] Lisboa: Centro de Filosofia da Universidade de Lisboa, 1998.
[2] Lisboa: Centro de Filosofia da Universidade de Lisboa, 2006.
[3] BRITO, José Henrique Silveira de (Coord.) - Temas fundamentais de ética. Actas do Colóquio de Homenagem ao Prof. P. Roque Cabral, S.J. Braga: Publicações da Faculdade de Filosofia UCP, 2001, pp. 73-88.
[4] Lisboa: Centro de Filosofia Universidade de Lisboa, 2013.

segunda-feira, 7 de julho de 2014

Filosofia, ciências humanas, letras: que empregos?

É sobejamente conhecida a dificuldade do acesso ao mercado de trabalho dos licenciados nas áreas das humanidades, em geral, sendo particularmente sentida pelos formados em Filosofia.
A orientação que durante décadas se imprimiu às licenciaturas em Filosofia, em Portugal, ligando-as quase exclusivamente ao desempenho da actividade docente nos estabelecimentos de ensino secundário e superior, em nada ajudou ao reconhecimento social e profissional da habilitação em Filosofia.
Ora, a Filosofia confere aos licenciados desta área potencialidades, saberes, competências de grande aplicação em muitos domínios da realidade e em diversos sectores laborais. Só para referir alguns: no campo da política, no mundo empresarial, nas indústrias criativas, na gestão dos recursos humanos, nas áreas da criação cultural e literária… A capacidade de adaptação dos “filósofos”, a sua criatividade e plasticidade mental, de interpretar e de pensar com rigor, aliadas à natural curiosidade cultural e interdisciplinar fazem com que a sua presença e o seu desempenho sejam frequentemente muito valorizados, qualquer que seja o ramo da actividade em que se encontrem a trabalhar. Só as mentalidades fechadas e deturpadas por uma incorrecta noção de “especialização profissional” continuam a achar que a Filosofia está “fora do mundo” ou que é “coisa de gente despistada”.
Precisamente, no encalço de operar a mudança destas mentalidades, Isabel Lasala e Laura Carratalá Díez, da Faculdade de Filosofia e Letras da Universidade de Saragoça, publicaram um interessante estudo que mantém toda a actualidade, intitulado Nuevas perspectivas profesionales de las Ciencias Humanas.
A iniciativa destas autoras é um bom contributo e exemplo a seguir no complexo processo de reabilitação e revalorização das formações em Filosofia e mais em geral nas Ciências Humanas.

domingo, 6 de julho de 2014

A Filosofia contra a crise

A crise em que estamos mergulhados vai gerando consequências demolidoras nas pessoas, nas comunidades, nas instituições... visíveis um pouco por toda a parte por onde lancemos o nosso olhar. E se a magnitude do problema implica a convocação de todos os saberes para prover soluções com alguma eficácia, é também chegada a hora de envolver as humanidades, as artes e filosofia. Sim, os efeitos da crise, para não dizer mesmo as suas causas mais profundas, também se combatem com filosofia, isto é, com pensamento, reflexão, atitude crítica... e uma boa dose de humor inteligente.
Por falar em crises, conta-se que já o vetusto Tales de Mileto havia vencido um período de penúria económica do seu tempo antecipando-se a ele. Diz-se que o saber da filosofia lhe proporcionou uma vida abastada. Melhor do que qualquer economista...
Um serviço de consultas filosóficas surgido em Itália (Corigliano d’Otrano, Puglia) tenta ajudar a combater os efeitos da crise, mostrando essa dimensão prática da filosofia.

Cf. vídeo-notícia da AFPTV